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O museu e seu público no mundo “contaminado”
Alexandre Dias Ramos
O museu e seu público no mundo “contaminado”
Alexandre Dias Ramos
De que maneira um museu, nos dias de hoje, deve se relacionar com o público? Que público vai ao museu e quais os modos de apreensão que estão envolvidos no contato com a obra de arte, num mundo tão “contaminado” pelos meios de comunicação?
A “verdadeira obra de arte” tem aura, é original, autêntica, bonita... é sagrada, deve, portanto, ser mantida em ambiente ideal e exposta em lugar adequado, para um público adequado, relacionado a tudo o que se diz da Arte ao longo da História.
Será? Há muita confusão entre o pensamento tradicional museográfico – diretamente ligado aos cânones da História da Arte Ocidental – e a “contaminação” (para o bem e para o mal) dos meios de comunicação de massa na percepção das leituras da obra de arte. Sem dúvida, diminuiu o desequilíbrio dos tempos passados, em que a posse econômica ditava a hierarquia, assim como selecionava, com exclusividade, o público autorizado ao acesso aos bens simbólicos mais importantes. Agora essa hierarquia, ou melhor dizendo, esse posicionamento no campo cultural se organiza conforme o uso das estratégias e instrumentos daquele que possuir a informação e souber o que fazer com ela. O “ambiente ideal” deu lugar à multiplicidade de tempos e espaços, a aura (antes intocável) deu lugar à produção em massa e à fugacidade do objeto descartável, as regras da arte deram lugar às possibilidades da arte – que são muitas e dependem de quem as produz, de quem as divulga e de quem as vê. O processo artístico e os procedimentos museográficos tiveram de enfrentar as novas exigências da comunicação e de se adaptarem a elas. O pedestal de mármore foi substituído pelo suporte da mídia.
Mas será que a mídia promoveu o completo fim do sagrado? Não exatamente. Desconsiderando os medos da Escola de Frankfurt em relação à alienação dos meios de comunicação, vamos pegar o caso da TV: alguns espetáculos televisivos, concertos de rock, eleições, campeonatos de futebol e jogos olímpicos, por exemplo, podem, muito além do que se poderia imaginar, intensificar o sentido de sagrado. Vemos telespectadores participando ativamente de intensos processos de ritualização, vestindo-se de maneira especial, com uniformes, bandeiras, marcando encontros para uma participação coletiva de alegria, curiosidade ou dor (caso dos históricos funerais transmitidos via satélite). A televisão trouxe consigo a consciência do simulacro, da virtualidade, mas manteve instrumentos importantes para a fabricação e manutenção de tradições, cultos e conexões transnacionais. Os meios de comunicação destruíram a hegemonia da sacralização ortodoxa em nome de uma religião de práticas sociais que criam e recriam símbolos sagrados, muitas vezes no tempo e na efemeridade de um clic.
Porém, a idéia de que a cultura midiática regula totalmente o consumo desconsidera o comportamento dos consumidores e as desigualdades econômicas e culturais que limitam tais ações. Na maioria das vezes, as pessoas sabem a diferença entre as coisas, os produtos e a realidade. Sabem também qual a sua própria realidade. Entendem, por razões próprias, por que gostam mais de um trabalho de arte do que outro. Portanto, não se deve pensar o público como uma massa culturalmente dopada, subestimar sua formação. E, para que haja diálogo entre o museu e o público, é preciso levar em consideração as formas culturais que resumem as intenções dos produtores – seus propósitos e suas relações com produtos, patrocinadores, artistas etc. – e a diversidade de gostos, interesses e linguagens de seu público.
Edgar Morin vai dizer que “nossa relação com o mundo exterior passa não apenas pelas mídias informacionais, mas também por nossos sistemas de idéias, que recebem, filtram, fazem uma triagem daquilo que as mídias nos trazem. Em relação às coisas sobre as quais não temos opinião formada ou preconceito, somos extremamente suscetíveis às informações.” Processa-se, portanto, uma espécie de sistema circular contínuo, em que os agentes culturais produzem o que o público absorve ao mesmo tempo em que também produz... Conversar, assistir, apreciar, consumir são atividades exercidas na difusão dos meios de comunicação e filtradas, diversificadamente, conforme o habitus de classe específico de cada um. Os modos de recepção da informação são tão diversos quanto sua difusão.
Enfrentamos, hoje, novos processos de produção industrial e eletrônica, de circulação massiva e transnacional e, conseqüentemente, novos tipos de recepção e apropriação. Na medida em que cresce o domínio do homem sobre esses infinitos meios de informação, opera-se uma mudança no próprio homem e na percepção daquilo que ele produz. A chave, então, está no processo de seleção e interpretação da informação. O museu pode dar essa chave, servir de interface entre o arcabouço cultural do conhecimento erudito e o cotidiano.
A “verdadeira obra de arte” tem aura, é original, autêntica, bonita... é sagrada, deve, portanto, ser mantida em ambiente ideal e exposta em lugar adequado, para um público adequado, relacionado a tudo o que se diz da Arte ao longo da História.
Será? Há muita confusão entre o pensamento tradicional museográfico – diretamente ligado aos cânones da História da Arte Ocidental – e a “contaminação” (para o bem e para o mal) dos meios de comunicação de massa na percepção das leituras da obra de arte. Sem dúvida, diminuiu o desequilíbrio dos tempos passados, em que a posse econômica ditava a hierarquia, assim como selecionava, com exclusividade, o público autorizado ao acesso aos bens simbólicos mais importantes. Agora essa hierarquia, ou melhor dizendo, esse posicionamento no campo cultural se organiza conforme o uso das estratégias e instrumentos daquele que possuir a informação e souber o que fazer com ela. O “ambiente ideal” deu lugar à multiplicidade de tempos e espaços, a aura (antes intocável) deu lugar à produção em massa e à fugacidade do objeto descartável, as regras da arte deram lugar às possibilidades da arte – que são muitas e dependem de quem as produz, de quem as divulga e de quem as vê. O processo artístico e os procedimentos museográficos tiveram de enfrentar as novas exigências da comunicação e de se adaptarem a elas. O pedestal de mármore foi substituído pelo suporte da mídia.
Mas será que a mídia promoveu o completo fim do sagrado? Não exatamente. Desconsiderando os medos da Escola de Frankfurt em relação à alienação dos meios de comunicação, vamos pegar o caso da TV: alguns espetáculos televisivos, concertos de rock, eleições, campeonatos de futebol e jogos olímpicos, por exemplo, podem, muito além do que se poderia imaginar, intensificar o sentido de sagrado. Vemos telespectadores participando ativamente de intensos processos de ritualização, vestindo-se de maneira especial, com uniformes, bandeiras, marcando encontros para uma participação coletiva de alegria, curiosidade ou dor (caso dos históricos funerais transmitidos via satélite). A televisão trouxe consigo a consciência do simulacro, da virtualidade, mas manteve instrumentos importantes para a fabricação e manutenção de tradições, cultos e conexões transnacionais. Os meios de comunicação destruíram a hegemonia da sacralização ortodoxa em nome de uma religião de práticas sociais que criam e recriam símbolos sagrados, muitas vezes no tempo e na efemeridade de um clic.
Porém, a idéia de que a cultura midiática regula totalmente o consumo desconsidera o comportamento dos consumidores e as desigualdades econômicas e culturais que limitam tais ações. Na maioria das vezes, as pessoas sabem a diferença entre as coisas, os produtos e a realidade. Sabem também qual a sua própria realidade. Entendem, por razões próprias, por que gostam mais de um trabalho de arte do que outro. Portanto, não se deve pensar o público como uma massa culturalmente dopada, subestimar sua formação. E, para que haja diálogo entre o museu e o público, é preciso levar em consideração as formas culturais que resumem as intenções dos produtores – seus propósitos e suas relações com produtos, patrocinadores, artistas etc. – e a diversidade de gostos, interesses e linguagens de seu público.
Edgar Morin vai dizer que “nossa relação com o mundo exterior passa não apenas pelas mídias informacionais, mas também por nossos sistemas de idéias, que recebem, filtram, fazem uma triagem daquilo que as mídias nos trazem. Em relação às coisas sobre as quais não temos opinião formada ou preconceito, somos extremamente suscetíveis às informações.” Processa-se, portanto, uma espécie de sistema circular contínuo, em que os agentes culturais produzem o que o público absorve ao mesmo tempo em que também produz... Conversar, assistir, apreciar, consumir são atividades exercidas na difusão dos meios de comunicação e filtradas, diversificadamente, conforme o habitus de classe específico de cada um. Os modos de recepção da informação são tão diversos quanto sua difusão.
Enfrentamos, hoje, novos processos de produção industrial e eletrônica, de circulação massiva e transnacional e, conseqüentemente, novos tipos de recepção e apropriação. Na medida em que cresce o domínio do homem sobre esses infinitos meios de informação, opera-se uma mudança no próprio homem e na percepção daquilo que ele produz. A chave, então, está no processo de seleção e interpretação da informação. O museu pode dar essa chave, servir de interface entre o arcabouço cultural do conhecimento erudito e o cotidiano.
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